Artigo: 2022, um ano de desafios para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar – por Dinarte Bonetti e Jaqueline Finelli*
Fonte: Blog Abrapp
Dado que os Planos de Benefícios administrados pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPCs) têm o perfil de longo prazo, o que se pode esperar dos resultados das Avaliações Atuariais para 31 de dezembro de 2022, com base nos fatos ocorridos ao longo do ano, como a pandemia da COVID 19, a incessante guerra da Rússia com a Ucrânia, o fervor do processo eleitoral brasileiro e, por fim, a Copa do Mundo? Muitos são os desafios a serem enfrentados pelos dirigentes das EFPCs.
Os reflexos dessas ações podem impactar diretamente os resultados das Avaliações Atuariais de 31 de dezembro de 2022, que têm como objetivo principal dimensionar o valor das provisões matemáticas, dos fundos previdenciários e de outros compromissos dos Planos de Benefícios. Principalmente, nas definições das premissas econômicas e financeiras como da taxa real anual de juros, taxa de inflação, taxa real de crescimento salarial e de benefícios. E de outras premissas como as biométricas (de mortalidade, mortalidade de inválidos, entrada em invalidez, etc.) também as demográficas (composição familiar, rotatividade, entrada em aposentadoria, etc.).
Inflação
Segundo dados divulgados pela Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia, por meio do boletim “Macro Fiscal” de novembro de 2022, a estimativa da inflação foi reduzida para 2022 e a expectativa do governo é que termine o ano com alta de 5,85%. A projeção anterior, divulgada em setembro de 2022, era de alta de 6,3%. No entanto, apesar da queda, a estimativa de inflação do governo segue acima da meta para este ano, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que é de 3,5%.
A pressão inflacionária advinda dos fatores relatados afeta de forma direta o equilíbrio atuarial dos Planos, uma vez que os benefícios concedidos, de forma geral, estão atrelados à inflação. Nem sempre na mesma proporção este efeito é percebido pelos ativos garantidores desses Planos.
Ainda em relação à pressão inflacionária, vale lembrar da atual tendência de aplicação de ganhos reais ao salário mínimo, que também impactará o benefício futuro projetado sem necessariamente ser observado o mesmo impacto nos ativos garantidores.
Taxa de Juros
Nos últimos anos, têm sido vários os desafios em relação à taxa básica de juros no Brasil, onde saímos de uma taxa de 14,25% em 2016 atingindo o seu menor patamar histórico de 2,00% em 2021, e já tendo voltado à casa dos 13,75% em 2022. Esses movimentos, por se tratarem do cenário base de juros, fazem com que a gestão dos ativos garantidores das EFPCs se torne um enorme desafio. Os gestores de investimentos têm em seu papel a garantia da meta atuarial e a maximização do retorno das suas carteiras buscando dessa forma, em tempo de juros baixos, maior retorno, com consequente maior volatilidade nos mercados de renda variável. Já em tempos de juros mais altos e maiores, desafios nos cenários político, fiscal, cambial, buscam o “porto seguro” das taxas de renda fixa.
Por outro lado, os atuários têm observado também por consequência da volatilidade da taxa básica de juros, cenários muitos distintos por conta das Avaliações Atuariais onde em um ano a taxa de juros está em um patamar muito distinto do ano anterior, por exemplo. A complexidade está no surgimento e no desaparecimento de déficits de um período para o outro, o que coloca muitas vezes em cheque a razoabilidade dos cálculos atuariais. Vale lembrar que a taxa de juros básica tem um efeito muito relevante na Avaliação Atuarial o que pode colocar a perder por vezes a adequação de uma hipótese biométrica, como por exemplo, a adequação de uma tábua de mortalidade.
Assim sendo, a volatilidade do mercado tem contribuído para um gerenciamento do risco cada vez mais peculiar, com o objetivo de assegurar a solidez e o equilíbrio econômico-financeiro dos Planos de Benefícios das EFPCs.
COVID – 19
Não bastasse a complexidade de um cenário mundial tão adverso, os Planos de Benefícios sofreram ainda um impacto direto por conta dos efeitos da COVID -19.
A movimentação de participantes, influenciados pelos casos de mortalidade, advindos nos últimos anos em virtude da pandemia da COVID 19, talvez não sejam significativas a ponto de gerar ajustes nos testes de hipóteses, mas no entanto podem gerar impactos nas provisões matemáticas de benefícios concedidos, criando na maioria dos casos, uma redução na necessidade de constituição de provisão matemática em função dos óbitos.
Por outro lado, existe o impacto da mortalidade dos participantes em fase de acumulação o que gera o efeito inverso à mortalidade dos participantes já em gozo de benefício, dado que o falecimento desses participantes cessa a capitalização da reserva de benefícios programados (mutualização). Esse efeito também foi majorado pelo forte desemprego advindo da pandemia.
Environmental, Social, and Corporate Governance (ESG)[1]
O tema ESG, apesar de não se tratar de um conceito novo, voltou com força total após os efeitos devastadores da pandemia de COVID -19. Tais efeitos evidenciaram globalmente a importância da discussão e da inclusão desses aspectos nas empresas de forma geral. Neste contexto, os Planos de Benefícios das EFPCs desempenham um papel particularmente especial uma vez que são eles que garantem uma adequada qualidade de vida aos seus participantes, ao longo da sua vida laborativa e após ela.
Apesar dos temas de ESG não estarem ainda em 2022 na pauta direta das Entidades, esse tema passou a ser visto com grande valor pelos seus participantes e pelo mercado de forma geral. Ou seja, atualmente uma Entidade, quando da decisão dos seus investimentos, deve levar em consideração não só o retorno deste investimento, mas também o segmento da empresa que está sendo investida, o comprometimento desta empresa com os aspectos ambientais, sociais, etc. O que vale EFPC atingir todas as suas metas de investimento sendo estas provenientes de empresas com alto grau de pegada de carbono? Isto certamente, será cobrado cada vez mais pelos seus participantes.
Por fim, muito em breve, as empresas de forma geral, bem como seus fundos de pensão deverão demonstrar em relatórios específicos, às suas atividades que têm sido executadas para a contribuição com a Sociedade e o meio ambiente. Mais do que isso, essas atividades muito em breve deverão ser quantificadas e eventualmente contabilizadas em suas demonstrações financeiras.
Todos esses impactos mencionados anteriormente, podem atingir principalmente os Planos de Benefícios desenhados/estruturados nas modalidades de Benefício Definido e de Contribuição Variável, que por sua vez são mais sensíveis às variáveis em questão, pois carregam uma parcela de risco atuarial que necessita de um acompanhamento/gerenciamento ativo e consistente por parte das EFPCs.
O que se observa é que nos últimos tempos os desafios têm sido imensos para os dirigentes das EFPCs equilibrarem os resultados dos Planos de Benefícios e por isso uma gestão cada vez mais efetiva se faz necessária, regada de muita disciplina e de orientação para seus Patrocinadores e Participantes dos Planos, oferecendo esclarecimentos, por meio de ações como de Educação Financeira e Previdenciária, fomentando cada vez mais esse mercado previdenciário.
*Dinarte Bonetti, Sócio Atuarial da PwC e Jaqueline Finelli, Gerente Sênior Atuarial da PwC.